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Projeto de escuta na praça expande o cuidado em saúde mental para moradores de São José do Rio Claro-MT

Publicado em:
19 de fevereiro de 2022

Whats App Image 2022 02 18 at 15.29.46 1 1024x427Ao caminhar por uma das praças de São José do Rio Claro, pequeno município de 20 mil habitantes situado no estado do Mato Grosso, o morador da cidade pode se deparar com um convite inesperado. Diante de uma mesa, duas cadeiras e alguém disponível para ouvir, um cartaz enuncia a proposta: “Escuta Individual – falar é a melhor solução, ouvir é o melhor remédio”. O projeto, aparentemente simples, tem a proposta de levar saúde mental a uma população pouco familiarizada com essa forma de cuidado. Os moradores de São José do Rio Claro se organizam em torno de uma economia marcada pelo agronegócio, após longos períodos de extrativismo dos ciclos da borracha e da madeira, onde muitas vezes o conflito se resolve seguindo o ditado do “olho por olho, dente por dente”.

A intensificação dos distúrbios psicológicos no contexto da pandemia levou a gestão municipal a mobilizar esforços em torno da estruturação da rede de saúde mental, o que resultou, dentre outras iniciativas, na formulação do projeto. As intervenções nas praças foram iniciadas em setembro de 2021 e seguiram até janeiro de 2022, por meio de uma mobilização que envolveu profissionais de saúde e membros da sociedade civil organizada, como integrantes do Conselho Municipal de Saúde e lideranças religiosas. “Não tínhamos um fluxo de saúde mental estabelecido, mas os indicadores apontavam para a necessidade urgente e emergente da fala. As queixas apareciam em todo sistema porque as pessoas queriam ser ouvidas. Conversamos com pastores, padres, sociedade e servidores que tinham perfil de escuta para desenvolver o projeto na programação do Setembro Amarelo”, detalha a secretária de saúde, Cleide Maria Anzil.

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A proposta foi inspirada na experiência da psicóloga Géssica Benício Freitas, que durante o período em que cursou psicologia na capital Cuiabá acompanhou o projeto Escuta na Praça. Com características bem semelhantes, a metodologia segue mecanismos pouco intervencionistas. Há um roteiro pré-estabelecido, com critérios em relação à forma de desenvolver a escuta, que se baseia em pouca interferência na fala, ausência de julgamento de valores, de comentários pejorativos e garantia do caráter sigiloso da conversa. O objetivo é estabelecer uma relação de confiança entre o profissional e o usuário. “Nos espaços abertos, a gente abre a possibilidade de fala para a população, levando saúde mental a uma cidade que não tem muito esse conhecimento. Percebo que ainda há resistência, mas muitas pessoas estão procurando o serviço”, diz a psicóloga.

Além dos convites estampados em cartazes, a população teve acesso ao projeto via divulgação na mídia e na praça central da cidade – onde acontece a feira -, através da música e do teatro. Nos casos em que é identificava a necessidade de acompanhamento mais especializado, o usuário passa por uma anamnese com uma das psicólogas da rede, no intuito de avaliar a possibilidade de encaminhamento para a unidade básica de saúde (UBS) ou diretamente para o Centro de Especialidades, onde há oferta de atendimento psicoterapêutico. Do total de pessoas ouvidas, sete precisaram de encaminhamento. Atualmente, a rede de saúde mental é composta por três psicólogas e um psiquiatra.

A cada encontro, cerca de 12 profissionais são mobilizados e os ciclos de escuta acontecem de forma rotativa nas praças da cidade onde há UBS instaladas. Nas seis ações realizadas, foram ouvidas cerca de 20 pessoas, número aparentemente pequeno mas que reverberou de forma surpreendente na cidade. Durante a 1ª Conferência Municipal de Saúde Mental, ocorrida no dia 31 de janeiro de 2022, o projeto foi muito bem avaliado, com várias solicitações de ampliação. As atividades, que estão suspensas para avaliação, serão retomadas em abril com público definido. A experiência recomeça com uma parceria envolvendo a Secretaria de Educação, para que alunos da rede pública recebam prioridade na escuta, considerando o aumento de casos de depressão, ansiedade, automutilação e ideação suicida entre crianças e adolescentes.

Lindalva Pereira Satel trabalha no setor de limpeza da Secretaria Municipal de Saúde. Ela foi atendida no projeto e se sentiu muito gratificada pela experiência. Antiga servidora da educação, Lindalva relata que durante a conversa pode compartilhar suas dificuldades no contexto familiar. “Me senti muito segura e aliviada por estar falando. O projeto é ótimo porque vem ajudando as pessoas a participarem mais e dialogar”, elogia. Na avaliação das profissionais de saúde, boa parte dos depoimentos, a exemplo da auxiliar de limpeza, se refere a problemas cotidianos no âmbito familiar e no trabalho, como também está relacionada ao desgaste do isolamento causado pela pandemia. Contudo, casos de depressão e ansiedade foram detectados e encaminhados.

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Saúde do trabalhador

Ao assumir a pasta da saúde, a secretária municipal Cleide Maria Anzil reuniu todos os esforços para estruturar a rede de saúde mental, já que o contexto evidenciava a necessidade urgente de suporte psicológico para a população a para os próprios trabalhadores. Casos de ideação suicida entre os profissionais de saúde impulsionaram a publicação de uma Portaria criando a Política de Saúde do Trabalhador, que começou a ser implementada em junho de 2021. “Quando acompanhei os casos de suicídio e tentativa de suicídio entre profissionais da rede de saúde, no ano passado, percebi a gravidade da situação. Começamos então a estruturar a saúde mental”, detalha a secretária.

O primeiro passo direcionado ao cuidado dos profissionais de saúde foi a contratação da psicóloga Géssica, que iniciou o mapeamento das condições de saúde desses servidores. Dos 135 funcionários da pasta, 70 já foram atendidos em quatro unidades básicas de saúde. O trabalho segue com o mapeamento das duas UBS restantes e com o acompanhamento psicológico de 30 servidores no Centro de Especialidades. “A saúde mental muda a vida das pessoas no contexto geral, porque pode ajuda-las a viver de forma totalmente diferente. O nosso trabalho é muito difícil quando vemos tantas pessoas passando por sofrimento psíquico e não podemos ajudar como gostaríamos. Mas quando conseguimos, é muito gratificante”, diz a psicóloga.

Em parceria com o Estado, os servidores também estão recebendo acompanhamento psicológico virtual, como também está em curso uma proposta de capacitação regional em saúde mental para os trabalhadores da rede pública municipal. O objetivo é ampliar a oferta de cuidado em saúde mental nas UBS. “Como gestora, me sinto desafiada a minimizar o que é urgente e construir a rede de saúde mental. A experiência é muito gratificante e acho que esse trabalho vai deixar uma marca na saúde mental do município. Talvez aqui nasçam algumas experiências que possam ser levadas ao país”, projeta a secretária.

FONTE: CONASEMS

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